Gênesis 2 não apresenta, de modo algum, um relato da criação, mas supõe o término da obra criadora de Deus, conforme narrada no capítulo 1. Os três primeiros versículos de Gênesis 2 simplesmente levam a narrativa do capítulo 1 a uma conclusão lógica e irreversível, usando o mesmo vocabulário e estilo empregado no capítulo anterior. Mostra o trabalho completo da criação e estabelece a santidade especial do sétimo dia como símbolo e memorial da obra criadora de Deus. A seguir, o versículo 4 resume a narrativa toda ao afirmar: “Esta é a história das origens dos céus e da terra, no tempo em que foram criados”. Tendo terminado a pesquisa geral sobre o assunto, o autor narra, a seguir, com minúcias, um fato importante já mencionado: a criação do homem. Assim diz Kenneth Kitchen:
Gênesis 1 menciona a criação do homem como último elemento de uma série, sem quaisquer detalhes, enquanto em Gênesis 2 o homem é o centro do interesse, surgindo pormenores mais específicos a respeito do ser humano e de seu ambiente. Deixar de reconhecer a natureza complementar da distinção temática entre um esboço rápido de toda a obra criadora, por um lado.e a concentração nas minúcias da criação do homem e de seu ambiente, por outro, quase equivale ao obscurantismo (Ancient Oríent, p. 117).
A seguir, Kitchen descreve a analogia das incrições egípcias, como a tábua poética de Carnac, de Tutmés III, de Gebel Barkal.e as inscrições reais de Urartu, que atribuem a derrota dos inimigos da nação a seu deus-patrono, Haldi, e em seguida relatam as mesmas vitórias em minúcias, as que foram conseguidas pelo rei de Urartu na ocasião. Depois, acrescenta esse autor:
O que seria absurdo nos monumentais textos do Oriente Próximo, que não tiveram nenhuma pré-história registrada, não deveria ser imposto a Gênesis 1 e 2, como se faz pela perpetuação de uma sistematização do século XIX, destituída de crítica resultante de especulações feitas por diletantes do século XVIII, aos quais falta, como sempre, todo o conhecimento das formas e usos da literatura oriental antiga (Ibid.).
Quando examinamos o restante do capítulo 2 de Gênesis, descobrimos que ele trata da descrição do ambiente ideal que Deus preparou para Adão e Eva, no qual pudessem iniciar sua vida, caminhando em íntima comunhão com o Senhor, como filhos atenciosos e obedientes. Os versículos 5 e 6 descrevem o estado original da “terra”, ou do “chão”, a região ampla do jardim do Éden, antes de surgir a verdura por causa do sistema de irrigação usado pelo Senhor. O versículo 7 apresenta Adão como o inquilino recentemente amoldado, para quem Deus preparou o Éden. O versículo 8 narra como o primeiro homem foi colocado ali a fim de observar e desfrutar a beleza e a riqueza do lugar.
Os versículos de 9 a 14 descrevem os vários tipos de árvore e a viçosa vegetação regada pelas águas abundantes dos rios que saíam do Éden, indo para as regiões mais baixas além de seus limites. O versículo 15 indica a atividade evolvente que o Senhor atribuiu a Adão como guarda e lavrador de tão grande reserva ecológica. Um estudo minucioso dos primeiros quinze versículos do capítulo 2 tornará bem evidente que esse texto nunca teve o objetivo de ser uma descrição genérica da criação. Faça-se uma pesquisa das cosmogonias de antigas civilizações do Oriente Próximo e jamais se encontrará entre elas um único registro da criação que omita a formação do Sol, da Lua, das estrelas, dos oceanos e dos mares — e nada disso se menciona em Gênesis 2.
É óbvio, portanto, que Gênesis 1 é a única descrição da obra criadora de Deus, encontrada nas Escrituras Sagradas, estando pressuposta no contexto de Gênesis 2. Nem os animais são mencionados, até o Senhor atribuir a Adão a tarefa de examiná-los cuidadosamente, um por um, a fim de decidir que nome será mais adequado para cada tipo de mamífero, de ave, ou de outros seres trazidos à sua presença (v. 18-20). Todavia, antes que se inicie essa fase da experiência de Adão, ele é levado a um relacionamento de aliança com Deus, que lhe concede permissão para comer dos frutos de todas as árvores, menos da do conhecimento do bem e do mal (v. 16, 17).
A seguir, o versículo 18 mostra como Iavé atendeu à necessidade, que ele mesmo previra, de uma companheira para o homem — primeiramente mediante a convivência de Adão com os animais e aves (v. 19, 20) e, a seguir, depois de verificar que essa comunhão era incompleta, por meio da companhia de sua mulher, criada a partir de um osso tirado de perto do coração de nosso primeiro pai (v. 21, 22). Encerra-se o capítulo com a cena da alegre aceitação por parte de Adão da auxiliadora recém-criada, que lhe dedicaria fidelidade e amor sem reservas. A estrutura de Gênesis 2 estabelece claro contraste com todos os relatos da obra criadora conhecidos na literatura comparada.
Esse capítulo não teve o objetivo de ser um relato da criação, exceto no que concerne às circunstâncias do surgimento do homem como filho de Deus, feito à sua imagem, tendo recebido o sopro vital e sendo conduzido a um relacionamento pessoal com o próprio Senhor. Fica bem claro, portanto, que o capítulo 2 foi redigido sobre os alicerces do capítulo 1 e que não representa tradição diferente da que originou o primeiro nem é relato discrepante da ordem da criação.
Fonte: Enciclopédia de Temas Bíblicos
Respostas às principais dúvidas, dificuldades e “contradições” da bíblia
Gleason Archer
Editora : Vida – pgs: 61-62
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